PRÉ-HISTÓRIA DE GUERRA - POR RUI NAMORADO (Republicamos com a vénia devida) pelo flagrante da sua atualidade.

PUBLICAMOS, COM A VÉNIA DEVIDA, A RECORDAÇÃO DO POEMA PRÉ-HISTÓRIA DE GUERRA DO DOUTOR RUI NAMORADO QUE PODE (E DEVE) SER APRECIADO NO SEU BLOG O GRANDE ZOO in http://ograndezoo.blogspot.com, com as anotações devidas.

                                          


                                                         Escreve RUI NAMORADO:

Publiquei, hoje, no meu Blog O Grande Zoo   http://ograndezoo.blogspot.com , um poema, “Pré-história de guerra” que evoca o risco de uma guerra nuclear-

Cordiais saudações do

Rui Namorado




Em Fevereiro de 1996, quando eu era deputado na AR pelo PS, publiquei um livro de poemas , “Sete Caminhos”, através da editora Fora do Texto [Centelha].

O livro estava organizado em sete partes, uma das quais a penúltima se intitulava “Pré-história”. Era composta por quatro poemas, um dos quais “Pré-história de guerra” evocava o risco de uma guerra nuclear- O título sugeria que estávamos perante um risco que perdera actualidade.

Hoje, passados todos estes anos, vemos que assim não é. Por essa razão resolvi recordá-lo aqui.

_________________-

 

PRÉ-HISTÓRIA DE GUERRA

 

1.

a pomba foi morta pelo general

 

calculou  o sítio exacto

o lugar único    onde a morte esperava

 

 no relatório omitiu a cor branca da vítima

e aquela leve pluma de ternura

visível no seu olhar    depois de morta

 

parecia mais pena    do que saudade ou terror

mais um enorme peso de braços caídos

do que o gelo transido do pânico

 

o general descreveu com precisão

a trajectória magnífica do tiro

o seu rigor    a rapidez fatal

 

com palavras antigas   sincopadas

ao ritmo dos tambores de mil batalhas

 

2.

quando pouco tempo depois lhe disseram

que o neto   o filho   a sua velha mãe

a mulher cujo sabor guardava dia a dia

a casa com jardim e duas árvores

a rua suave     a cidade onde nascera

eram agora uma nuvem espessa de cinza

onde a custo emergia o esqueleto de uma árvore sozinha

 

o general suspendeu o relatório

e teve um suor frio vindo da raiz da alma

 

mas quando lhe vieram dizer pouco depois

que era inútil mandar o relatório

porque o lugar que o ia receber não existia

 

o general chorou como um menino perdido

 

e  foi então que o sol se perdeu numa nuvem de poeira

e um doce sabor a morte   azul e profundo

entrou pelo general até aos ossos

 

3.

a mão do general ficou ligeiramente tombada

sobre a folha do relatório vitorioso

 

ocultou um pouco a trajectória da bala

a palavra pomba parecia agora levemente manchada

 

e junto à porta o olhar fixo do jovem ajudante

era um vidro de espanto gravado no general

 

tudo à volta estava finalmente tranquilo

a paz fulminantemente conquistada

 


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