HEROICA MARINA, EDITORA RUSSA CONTRA A INVASÃO DA UCRÂNIA
MINHA
QUERIDA MARINA,
CARA CAMARADA, EDITORA DO CANAL 1 DE
TELEVISÃO ESTATAL RUSSA;
De muito longe, do extremo ocidental da Europa, de Coimbra, Portugal, venho
enviar-te um grande abraço solidário. Tive conhecimento daqueles fabulosos
cinco segundos em que, ousadamente, mostraste aos espetadores do teu país, a
Rússia, as mentiras que o teu canal tem veiculado junto do povo russo em
relação à invasão da pacífica Ucrânia. Tu foste dizer aos russos aquilo que
eles sabem, mas talvez estejam a fingir não saber por causa da ditadura que aí
se vive. Tu, apareceste por detrás da jornalista pivot e exibiste um cartaz que
pedia o fim da guerra e a paz entre o teu país e a Ucrânia. És editora, talvez
muitas vezes tenhas feito a seleção e alinhamento do telejornal contrariada
porque não é fácil viver num regime como esse. Nós, em Portugal, os mais velhos
da rádio, da televisão e dos jornais, sabemos o que foi lutar contra a censura
e a ditadura, procurar escrever nas entrelinhas ou rodar, em vez da canção original,
um velho disco instrumental já que o original (cantado) estava censoriamente
proibido e nós, dizíamos o título do tema e o poema todo ou quase todo na
apresentação. Não se ouvia a voz do cantor, mas nós íamos dizendo o poema
direta ou indiretamente. Imagina que num jornal desportivo que editei, aqui em
Coimbra, de seu título CENTRO DESPORTIVO, a Censura não me deixava publicar
artigos do professor e treinador de basquetebol, Alberto Martins, apenas porque
o “nome” Alberto Martins era idêntico ao do então presidente da Direção Geral
da Académica em 1969, Alberto Martins, que pediu a palavra em nome dos
estudante, palavra que não lhe foi dada numa sessão com o chefe de Estado e, a partir
de então, ficou proscrito – e isto aconteceu na inauguração do edifício das
Matemáticas a 17 de abril de 1969. Falta um mês para a comemoração da
efeméride. Vê como a burra da censura até de uma homonímia tinha medo.
Confesso-te que eu nunca fui corajoso como tu e, por isso, ainda mais admiro o
teu heroico gesto antes explicado num vídeo que fizeste dando conta da vergonha
que sentias por publicares notícias falsas…e nada poderes fazer…até que um dia
surge a coragem de dentro, do mais profundo de nós e dizemos tudo, certo? Foi o
que fizeste. Tu viste as chorosas mães a saírem da Ucrânia com os filhos
enregelados e toda a sua vida e pertences dentro de um saco de plástico – é o
que temos visto angustiados. Tanta lágrima vertida, lágrimas que me doem tanto,
corpos pelo chão à espera de irem talvez para uma vala comum. Que merda de
líder aciona tal tragédia, Marina? Aqui juntamos as nossas lágrimas à do povo
ucraniano e até às dos soldados russos que morrem nesta guerra e que na sua
maioria não desejam: há um mar de lágrimas que nos salga a alma. Sabes, Marina,
que provavelmente poderá aparecer alguém a dizer que o jornalista relata factos
e não causas. Por mim, acredita, fizeste um excelente trabalho como
jornalista mostrando a tua CAUSA que se chama HUMANISMO e DIGNIDADE valores e
virtudes que relataste. Se eu pudesse, Marina, nomear-te-ia para o NOBEL DA PAZ.
Se não fores presa e vieres um dia a Portugal gostaria muito de te convidar
para bebermos um copo, mostrar-te Coimbra e levar-te a uma sessão de fados e
canções de Coimbra. Pediria, então, que te cantassem um belíssimo tema de
Manuel Alegre com música de António Portugal:
Pergunto ao vento que passa
Notícias do meu país
O vento cala a desgraça
O vento nada me diz/
Pediria também ao Manuel Alegre que me desse autorização para
referir que este poema agora pode ser uma imagem da tua Rússia, do teu país.
Mas há sempre alguém que resiste, e foi o que tu fizeste,
querida MARINA, cara camarada, não deixaste que o vento continuasse a calar a
desgraça que tem sido originada pelos tiros, bombas e mísseis atirados na
direção da pacata Ucrânia.
Um abraço solidário, QUERIDA MARINA, com a força da alma
de um Portugal que está em força moral com a Ucrânia. E, claro, contigo. Espero que não te prendam,
pois já basta ver também jornalistas a morrerem na Ucrânia para relatarem
factualmente esta horribilíssima guerra.
(Spasibo, Marina)
Sansão Coelho
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