JÁ CÁ NÃO ESTÁ QUEM FALOU: O POETA ALEXANDRE O´NEILL
ESCREVE O DOUTOR JORGE TOCHA COELHO
Já
cá não está quem falou: o poeta Alexandre O`Neill
Alexandre O`Neill (1924-1986) foi um
dos mais extraordinários poetas da Língua Portuguesa. Trabalhou com livros na
biblioteca itinerante da Gulbenkian e com as palavras na publicidade. É autor
do célebre provérbio “ Há mar e mar, há
ir e voltar” assim como de outra máxima genial “Parker
preenche em silêncio o seu papel”. Foi um dos membros fundadores do
movimento surrealista em Portugal e que mais tarde veio a abandonar. Publicou
vários livros entre os quais “ No Reino da Dinamarca” que marca a estreia em
Portugal de uma nova forma de dizer poesia.
O`Neill colaborou em jornais com prosas
que foram posteriormente incluídas em livros de poesia e escreveu várias
crónicas que foram, mais tarde, reunidas num volume “ Uma Coisa em Forma de Assim”.
Recusou os títulos de poeta satírico e
de Blogger. Para a história fica o célebre poema “ Um Adeus Português”,
da sua autoria, considerado um dos melhores do século passado e que serviu de
título a um filme de João Botelho. O poema tem a sua origem num episódio
biográfico passado no início de 1950 em que Nora Mitrani, enviada do
surrealismo francês para fazer uma conferência em Portugal, conheceu O`Neill e
apaixonaram-se. Mais tarde este quis reunir-se com ela em Paris, e, por isso, foi
chamado à PIDE e interrogado. Por pressão de uma pessoa da família foi-lhe
negado o passaporte. Obrigado a ficar em Portugal não voltaria a ver Nora
Mitrani . Soube mais tarde que a sua amada que acabou por falecer em França,
vítima de cancro, adorou o poema que lhe dedicou.
A obra de O`Neill está dispersa por
diversos títulos, nos quais, entre outras observações, satirizou Portugal e os
portugueses, incluindo a imagem de um proletariado heroico criado pelo
neorrealismo , contrapondo a essa visão a vida mesquinha, a dor do quotidiano,
vista no entanto sem dramatismos ironicamente “numa alternância entre a
constatação do absurdo da vida e o humor como única forma de se lhe opor” .
Embora não fosse um escritor
profissional, viveu sempre da escrita ou de trabalhos relacionados com livros,
tendo, a partir de 1957, começado a escrever para os jornais, primeiro de forma
esporádica, e depois, nas décadas seguintes, assinou colunas regulares no Diário de Lisboa, n´A Capital e, nos anos
80, no Jornal de Letras, escrevendo indiferentemente
prosa e poesia.
A sua vida sentimental foi enriquecida
com dois casamentos: primeiro com Noémia Delgado, nascida em Moçambique, e, mais
tarde, com Teresa Patrícia Gouveia que pertenceu ao governo de Cavaco Silva,
como secretária de Estado. Desses matrimónios nasceram dois filhos, tendo um
deles, Alexandre nascido em 13 de Dezembro de 1959 que viria a morrer solteiro
em Boston, nos Estados Unidos, em Janeiro de 1993. A sua segunda mulher, Teresa, foi mãe do seu segundo filho, Afonso, nascido a 28 de Maio de 1976. Nesse ano sofreu
um ataque cardíaco que o poeta admitiu ser fruto da sua vida desregrada que
sempre tinha levado, mas esse aviso não lhe serviu para ter cuidado com a saúde,
pois, em 1984, sofreu um acidente vascular cerebral de que veio a falecer em 21
de Agosto de 1986, aos 61 anos. Em 10 de Junho de 1990, foi condecorado, a
título póstumo com o grau de Grande Oficial da Ordem Militar de Santiago da
Espada. A sua biblioteca foi doada a Constância.
Em relação a “Há mar e mar, há ir e
voltar“ - devemos-lhe esta frase, elevada a provérbio, e aproveitada para uma
campanha do Instituto de Socorros a Náufragos para prevenir os afogamentos nas
praias portuguesas.
Jorge Tocha
Coelho
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