DR. TOCHA COELHO E A ATUALIDADE NO BRASIL: BOLSONARO EM MAUS LENÇÓIS
O ANTIGO E PRESTIGIADO JUIZ DOUTOR TOCHA COELHO
COM A SUA EXPERIÊNCIA PROFISSINAL E DE VIDA,
ESCREVE ACERCA DE UM TEMA DA ATUALIDADE BRASILEIRA:
BOLSONARO EM MAUS LENÇÓIS*
Bolsonaro
não para de surpreender e, depois do que se tem escrito, encontra-se, agora, em
luta com o Supremo Tribunal Federal (STF), a mais alta instituição judicial do
país que não o deixa sossegado, desde a tomada de posse, em 1 de Janeiro de
2019. Não têm conta os decretos presidenciais suspensos, censurados ou anulados
pelo STF, além de ter sido bloqueada a transferência de competências do
Ministério da Agricultura sobre a delimitação das terras indígenas (2019), o
travão imposto quanto ao uso indiscriminado de armas de fogo (2019), sem esquecer
que suspendeu a nomeação de um homem da sua confiança para chefe da polícia
federal (2020). Mas a atividade do STF não ficou por aqui, pois realizou
diversos inquéritos judiciários, atacando diretamente o poder executivo: O
primeiro, em 2019 tratou da difusão massiva de falsas informações e de ameaças,
visando aquele tribunal, o segundo, aberto em Julho, concentrou-se sobre a
suposta existência de organizações de extrema-direita, que procuram atacar a
democracia brasileira. Bolsonaro, já acostumado a dirigir insultos aos juízes,
ameaçou enviar tropas para fechar o STF. A instituição foi a besta negra das
grandes manifestações de 7 de Setembro, dia da Independência do Brasil, organizadas
pelo poder, uma vez que, segundo os contestatários, aquela instituição judicial
está infiltrada por comunistas que procuram instaurar uma “ Supremocracia” ou “
Ditadura das togas”.
O STF
tem um imenso poder que não resulta de usurpação, mas da estrutura própria da
Constituição de 1988. Desde 2000 tratou de grandes temas da sociedade, como a
autorização da união civil de pessoas do mesmo sexo, tornada possível em 2011.
Num discurso recente, o presidente do STF, Luís Fux, respondeu às ameaças do
clã presidencial e dos seus manifestantes e afirmou que “ninguém fechará este tribunal”.
O Supremo não é o único contrapoder no Brasil: Há igualmente o Congresso que,
entre outras funções, tem a pesada missão de votar ou não um crime de
responsabilidade e uma eventual destituição de um presidente da República - o
famoso impeachment - que provocou a queda de Fernando Collor (1992) da direita
e de Dilma Roussef (2016) da esquerda. Perante Bolsonaro, o Congresso opõe uma resistência
tímida, pois o homem encarregado de o “proteger”, Arthur Lira, deputado da direita,
originário do pequeno estado nordestino de Alagoas e que ocupa desde Fevereiro,
a presidência da Câmara dos deputados, é o único habilitado a pôr em marcha o
processo de impeachement. As ocasiões não faltam: perto de 140 pedidos de
destituição já entraram na Câmara desde a chegada ao poder de Bolsonaro. Lira,
além de ser fiel, também é inflexível: “ 100% dos pedidos de destituição que já
analisei são inúteis, declarou em Abril, e, até agora não mudou de opinião”. Se
a Câmara dos Deputados é fraca o Senado mostra-se mais forte. Em Abril
autorizou a criação de uma Comissão de Inquérito Parlamentar sobre a gestão da
pandemia, oficialmente responsável por cerca de 600 mil mortos no país,
colocando à luz do dia as aberrações, impreparações e suspeitas de corrupção,
pesando sobre o governo de Bolsonaro. Mas este não fica por aqui pois chega ao
ponto de não respeitar os direitos dos mais desfavorecidos. Este ano a pobreza
explodiu e deverá atingir um brasileiro em cada 3, ou seja 61,1 milhões. O
poder golpeia os programas sociais. A ajuda de urgência, posta em prática para
ajudar os mais modestos a fazer face à crise da Covid-19, viu o seu montante
máximo dividido por três: 60 € por mês e por habitação.
Esperava-se
que Bolsonaro, após o fracasso do seu contragolpe de estado em Setembro, fosse
mais prudente, evitando controvérsias e injúrias lançadas em rajada, como é seu
costume, que pelos vistos não vai mudar.
*Publicado há alguns dias na imprensa diária e aqui inserido a 2021/outubro/27
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